Outubro foi o mês de se renovarem os passes de transportes. No Porto, havia filas enormes em vários pontos da cidade, sobretudo nas estações de metro. As pessoas reclamavam das filas, do estado do tempo, da vida em geral. Bufavam, batiam o pé, cruzavam e descruzavam os braços, deixavam escapar o nome de Passos Coelho no meio da indignação e lá continuavam à espera.
Uma parte delas tinha mais de 65 anos e, por isso, vantagens especiais nos transportes. Quando chegava a sua vez, ainda não tinham tirado o passe da carteira e já se sabia metade da sua vida de viajante: “Sabe, eu moro não sei onde, apanho o 501 e depois o 305 para ir buscar o meu neto à escola...”. (“Vá lá, despache-se!” O operador abana a cabeça e olha insistentemente para o passe que parece não querer sair da mão da senhora). “Às vezes também vou buscar a minha neta, mas só às terças e quintas que é quando ela sai às 16h. Nesses dias apanho antes o 704. Eu gosto muito de ir para aqueles lados, sabe”.
Inconscientemente, aproveitam aquele tempo de atenção para contarem a sua vida e se fazerem ouvir. Devem ter esta necessidade por se sentirem sozinhas. E a solidão faz aumentar as filas e a impaciência dos funcionários.
Meia hora e dez relatos de viagens depois, chegou a minha vez. A pergunta saiu mecânica, sem sorrisos nem grande entoação:
- Cartão de estudante?
- Ah, eu já não estudo. É um passe normal... Quero dizer, mas eu leio todos os dias. Também conta?
- Ó menina, olhe para trás. Acha que, com esta fila toda, eu tenho paciência para brincadeiras?
Encolhi os ombros. Paguei o preço normal. Nestas alturas o bom humor é raro e (parte da) culpa é de os velhinhos estarem sozinhos.
Uma parte delas tinha mais de 65 anos e, por isso, vantagens especiais nos transportes. Quando chegava a sua vez, ainda não tinham tirado o passe da carteira e já se sabia metade da sua vida de viajante: “Sabe, eu moro não sei onde, apanho o 501 e depois o 305 para ir buscar o meu neto à escola...”. (“Vá lá, despache-se!” O operador abana a cabeça e olha insistentemente para o passe que parece não querer sair da mão da senhora). “Às vezes também vou buscar a minha neta, mas só às terças e quintas que é quando ela sai às 16h. Nesses dias apanho antes o 704. Eu gosto muito de ir para aqueles lados, sabe”.
Inconscientemente, aproveitam aquele tempo de atenção para contarem a sua vida e se fazerem ouvir. Devem ter esta necessidade por se sentirem sozinhas. E a solidão faz aumentar as filas e a impaciência dos funcionários.
Meia hora e dez relatos de viagens depois, chegou a minha vez. A pergunta saiu mecânica, sem sorrisos nem grande entoação:
- Cartão de estudante?
- Ah, eu já não estudo. É um passe normal... Quero dizer, mas eu leio todos os dias. Também conta?
- Ó menina, olhe para trás. Acha que, com esta fila toda, eu tenho paciência para brincadeiras?
Encolhi os ombros. Paguei o preço normal. Nestas alturas o bom humor é raro e (parte da) culpa é de os velhinhos estarem sozinhos.